segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Evolução (?)

Todo dia, assim que acordo, me boto a pensar em alguns fatos que me deixam assombrado. Um guri dos dias de hoje, caso tivesse a criação que eu tive, estaria morto. Simplesmente morto, cadavérico. Antes mesmo dos 10 anos de idade.
A começar que eu andava no banco de trás do carro. Sem cinto. Meus pais viajavam nos bancos da frente, mas também sem cinto. O carro não tinha ABS, computador de bordo, air-bag nem injeção eletrônica.
Encarei problema no radiador, em plena estrada, de madrugada. Sem celular.
Em casa, a coisa não era diferente.
Sede, eu resolvia com água da torneira. Da mangueira. Na pior das hipóteses, da chuva. Água de garrafa era coisa de ficção.
Bicicleta eu tive. Mas não tinha amortecedor dianteiro, garrafinha d'água, 133 marchas ou pedal que prendia na sapatilha. Inclusive, teria me machucado muito mais, caso utilizasse esse último recurso. A única coisa que a minha bicicleta tinha, era uma tampa de margarina presa no aro.
Pra fazer "barulho de motor".

Joelheira, nunca usei.
Com os carrinhos de rolimã, me jogava lomba abaixo. E nunca pude contar com os "freios" instalados (por mim mesmo, óbvio) no brinquedo.
Corria naquilo até me esborrachar na cerca ou em alguma árvore. Levantava, passava a mão na areia que ficava em cima do machucado e pronto. Subia de novo.
Nas férias, eu saía de casa e ficava na rua brincando o dia inteiro. Meus pais, às vezes, mal sabiam onde eu estava. Mas tinham a certeza de que eu não estaria em perigo.
Dei trabalho sim. Quebrei um ou outro osso. Esfolei, arranhei e perdi um dente. Que nasceu de novo. Mas não lembro de ter procurado culpados. Misteriosamente, os meninos daquela época resolviam suas encrencas sozinhos.
E quanta encrenca, hein.
Janela quebrada. Uma bola que caiu no pátio do vizinho.
Tudo isso resolvido sem nenhuma medida jurídica.

Comi tanto doce e tanto pão com manteiga, que me espanta ainda não ter morrido de obesidade mórbida. Dividi com meus amigos garrafas de refri, picolés e sanduíches. E nunca tive vermes. A "irresponsável" da minha avó preparava almoço e janta sem usar touca no cabelo, luvas esterilizadas e nem mesmo um avental.
Após temperar a salada, ia direto para a massa do pão.

Por falar em irresponsabilidade, minha mãe permitia que eu comesse uma tal de bala Soft. Engasgar com tal balinha era praticamente um ritual de passagem.
As embalagens de remédios ou as garrafas de refrigerantes não tinham nenhum tipo de tampinha especial, à prova de mim. Nem data de validade as embalagens traziam.
E tinham também aquelas bolinhas de gude, que vinham embaladas sem instruções de uso. Milagrosamente, nunca morri com uma delas presa à garganta.

Eu não tinha o Playstation, nem o Nintendo.
Não tinha TV a cabo, nem videocassete, nem computador, nem internet.
Tinha amigos. Bastante.
A gente andava de bicicleta ou a pé. Íamos a casa desses amigos, tocávamos a campainha, entrávamos e conversávamos.
Sozinhos, num mundo frio e cruel, sem nenhum controle.
No colégio, alguns estudantes não eram tão inteligentes quanto os outros, e tiveram que refazer a sexta série. Na minha época, não se mudavam as notas e as professoras eram insuportáveis. Não davam moleza. E eram respeitadas por isso.
Os maiores problemas nessa época eram: chegar atrasado, mastigar chicletes na sala de aula, mandar bilhetinhos para o colega do lado ou botar um apelido engraçado no amigo.
No máximo, correr demais no recreio ou matar aula.

As minhas iniciativas eram minhas, mas as conseqüências também. Ninguém se escondia atrás de um outro colega. Os nossos pais estavam sempre do lado da lei quando transgredíamos as regras. Se me comportava mal, meus pais me colocavam de castigo e, por incrível que pareça, nenhum deles foi abordado por algum integrante de ONG por isso. Eu sabia que, quando os pais diziam "não", era "não".
Presentes, eu ganhava no Natal ou no meu aniversário. Não em todas as vezes que ia ao supermercado. Sim, porque os shoppings ainda não haviam sido descobertos.
Quando meus pais me davam estes presentes, era por amor.
Não por culpa.

E mesmo assim, sobrevivi.
Se você passou por isso, e ainda está vivo para ler esse texto, meus mais sinceros parabéns.
Você teve o prazer de viver os anos mais felizes da sua vida.




Mais informações, no decorrer do período...



Um comentário:

disse...

Estamos vivendo em uma época de presente absoluto, igualmente ao passado, onde vivíamos um dia após o outro, sem futuro, diga-se assim. Onde as coisas eram simples e descomplicadas. Porém hoje, viver esse "presente", não tras benefício algum, as coisas são recebidas com muita facilidade, ao contrário daquela época. Chamria isso de escola da vida. A de hoje, está bem parecida com o ensino atual do país....hehehehe
Bjs...